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FACULDADES MONTEIRO LOBATO – FATO
CURSO DE PRODUÇÃO CÊNICA
Seminário – Alice Viveiros de Castro
ELOGIO DA BOBAGEM – Palhaços no Brasil e no
mundo
Elementos Estéticos e Técnicos do Circo
Izadora Fontoura
Jonas Piccoli
Renata Zonatto
Porto Alegre, 2014
“O Palhaço é a figura cômica por excelência. Ele é a
mais enlouquecida expressão da comicidade: é
tragicamente cômico. Tudo que é alucinante,
violento, excêntrico e absurdo é próprio do palhaço.
Ele não tem nenhum compromisso com qualquer
aparência de realidade. O palhaço é comicidade
pura.”pág 11
• O palhaço não é um personagem
exclusivo do circo. Mas foi dentro do
picadeiro que ele se tornou mais
conhecido e se tornou protagonista.
• Umas das grandes dificuldades dos
autores que estudam a origem dos
palhaços, está nos nomes que os
palhaços assumem em cada momento e
lugar. Clown – Grotesco – Truão – Bobo –
Excêntrico – Tony – Augusto – Jogral...
• Em português temos um nome comum
para todas as possíveis formas assumidas
por essa figura: PALHAÇO
• E não importa se sua cabeleira é
vermelha e os sapatos enormes ou se ele
está sem nenhuma maquiagem.
Identificamos um palhaço não apenas
pela forma, mas principalmente pela sua
capacidade de nos colocar, como
espectadores.
PALHAÇOS SAGRADOS E PROFANOS
O Riso e a Razão
• “O homem é o único animal que ri” -
disse Aristóteles
• A capacidade de rir nos aproxima de
Deus.
• Rimos com a inteligência, é preciso
compreender para achar graça.
• O riso pressupõe uma relação de
cumplicidade e o conhecimento de
inúmeras e sutis informações prévias.
• Millôr Fernandes complementou Aristóteles
dizendo que “o homem é o único animal
que ri e é rindo que ele mostra o animal que
é”
• “A principal função do riso é nos recolocar
diante da nossa mais pura essência: somos
animais. Nem deuses nem semi-deuses,
meras bestas tontas que comem, bebem,
amam e lutam desesperadamente para
sobreviver. A consciência disso é que nos faz
únicos, humanos.” pág 15
• A frase de Millôr nos traz também outras
leituras. Existe ética no riso? Rimos de
qualquer coisa? E onde fica o politicamente
correto tão em voga nos nossos tempos?
Piadas sexistas, racistas, excludentes,
reforçadoras de preconceitos provocam o
riso? Claro que sim. O ser humano é uma
besta, não é mesmo?
O Riso e o Rito
• O palhaço está presente em todas as culturas, e a mais antiga
expressão do personagem é a que se faz presente nos rituais
sagrados. Desde o início dos tempos, o riso foi e ainda é
utilizado como elemento ritual para espantar o medo,
especialmente o medo da morte.
• O diabo - ícone do Mal - assume inúmeras vezes um papel
cômico. Ridicularizar o Mal é uma das melhores formas de
vencê-lo...
• Na Cultura Ioruba as seis máscaras da cerimônia Egun-gun são
um corcunda, um albino, um leproso, um prognata, um anão e
um aleijado, figuras presentes entre os bufões de todos os
tempos.
• Os índios norte-americanos têm a figura dos heyokas, lembra
a tribo o absurdo dos comportamentos humanos e a
necessidade de não levar as regras demasiadamente a sério
• Os calmos monges budistas tibetanos têm a figura de Mi-
tshe-ring - o velho bufão sábio que atrapalha todas as solenes
cerimônias religiosas, incapaz de se controlar e de fazer
silêncio.
Uma das mais antigas profissões
• Cômico.
• Ricos ostentavam o seu palhaço exclusivo.
• Trabalhavam em casamentos, batizados, aniversários e
festas para os deuses
Egito
• Os faraós nobres não viviam sem um bufão ao seu lado.
• Eram autorizados a contradizer e ridicularizar o próprio faraó, mas nem sempre os
poderosos aceitavam bem as brincadeiras e o castigo vinha rápido e definitivo: a morte.
• Normalmente eram anões e corcundas. A deformidade lhes colocava em posição de
inferioridade, o que facilitava a aceitação do comportamento ousado. Algo que não deve
ser levado a sério – só uma piada.
China
• A China tem o mais antigo personagem cômico ainda em atividade: o Macaco da Ópera
chinesa – através de suas trapalhadas é responsável por corrigir a história desmascarando
o mal e premiando as boas intenções.
Índia
Vidusaka é um careca manico, quase anão, de dentes proeminentes e olhos vermelhos. Um
dos seus versos favoritos é: “Abençoados sejam os que estão embriagados de bebida,
abençoados os bêbados de bebida, abençoados os encharcados de bebida e abençoados
todos os que estão afogados na bebida!”
História de Birbal Numa noite de tédio o Imperador da um tapa na cara de Birbal, sem
motivo nenhum. Imediatamente Birbal se vira para o nobre que está mais próximo e lhe dá
um tapa na cara igual ao que recebeu, o nobre era novo na corte e achando que era uma
brincadeira, deu um tapa na pessoa que estava ao seu lado, e assim o tapa voltou para o
imperador.
“É um jogo. Você recebe um tapa e passa adiante. A única regra é que não se pode bater na
pessoa que lhe bateu, cada um bate numa outra pessoa. Como foi você quem começou, agora
o círculo se fechou, o ciclo se cumpriu...”
Grêcia
Os pregos tinham a figura dos parasitas – significava conviva, aquele que alegrava um
banquete.
• A história guardou o nome de Philipos, exímio imitador que arrancava gargalhadas.
Sócrates tentou calá-lo, mas o parasita imitou-o com tal perfeição que quem teve que se
calar foi o filósofo.
Os Mimos
• O teatro começa na Grécia com peças curtas, representadas pelas trupes ambulantes vindas
da região Dórica.
• Os palhaços Dóricos, assim como as peças curtas, são chamados de mimos. Hoje o termo é
associado a mímica e a pantomima.
• Ato de imitar – os artistas se especializavam em imitar personalidades da sociedade da
época.
Roma
• Todo nobre mantinha em sua casa uma trupe de palhaços anões. Dizia-se que ter um anão
em casa dava sorte.
• Anões, corcundas e feios tinham no humor uma possibilidade de sobrevivência e de
ascensão social.
• Uma simples resposta bem dada, transformava um anão palhaço num sábio.
O Cômico na Idade Média
e no Renascentismo
• Quando o Império Romano se torna
cristão os artistas sofrem muito,
especialmente os artistas do riso e das
diversões em geral.
• Os artistas viram bandos itinerantes,
apresentando-se em castelos, em feiras
e festas de aldeia.
• Durante muitos séculos , só teremos
notícias de espetáculos religiosos.
O Mundo ao Contrário, a Festa dos
Loucos e dos Asnos
• Em Roma, uma velha tradição banida pela
igreja volta com força total. As saturnais – os
escravos vestiam-se como os patrões,
sentavam-se a mesa com eles e celebravam a
“Idade de Ouro”, aquela em que a igualdade
imperava e todos os homens confraternizavam
em harmonia.
• Na Europa Medieval, as saturnais foram
transformadas na “Festa dos Loucos”, quando
os estudantes e membros inferiores do clero invertem a hierarquia e instalam a esbórnia
nas igrejas.
• Elegiam um bispo, rezavam uma missa cômica, com versões satíricas e picantes das rezas.
Os padres eram extravagantes, com roupas femininas, cantavam, jogavam cartas e dados.
Isso tudo dentro das igrejas e em torno delas.
• Em alguns lugares era chamada a “Festa dos Asnos” – quando um burro era sagrado bispo.
• Um mundo ao contrário, onde tudo virava de ponta cabeça, as regras se invertiam e os
poderes também.
Os Bobos da Corte na Idade
Média
• Na cabeça um chapéu cheio de longas
pontas com guizos em cada uma delas. Na
mão um cetro – símbolo da loucura. A
roupa é colorida, com triângulos de cores
diferentes. Na cintura, uma espada de
madeira e um bastão com uma bexiga de
porco cheia de ervilhas secas.
• Os bobos usavam, preferencialmente
verde e amarelo.
• Mulheres também exerciam o oficio.
Os Saltimbancos e as Feiras
• Depois que os grandes circos romanos foram abandonados, por muitos anos a Europa não
viu nada que pudesse chamar de espetáculo circense.
• Pouco a pouco a igreja começa a incentivar a realização de espetáculos que contam a vida de
Cristo e dos santos. No inicio eram pequenas apresentações dentro das igrejas, mas a coisa
foi crescendo, tomou as ruas, e ao final, envolvia toda a cidade.
• Esse fenômeno artístico aconteceu estreitamente ligado ao crescimento das feiras.
• Para chamar a atenção, armava-se um pequeno tablado – tipo um banco – e, encima dele,
eram realizados os espetáculos . Vem daí o termo saltimbanco, “Saltare in banco”.
• No inicio bastava um banco, depois um tablado com cortinas e, mais tarde, foram sendo
construídos verdadeiros teatros.
Commedia Dell’ arte
• O termo Commedia Dell’arte surge no início do século XVI
como forma de diferenciar o tradicional espetáculo popular
beseado na improvisação e na habilidade dos atores – da
commedia erudita, o teatro culto.
• Personagens estúpidos, maridos traídos, velhos babões, avarentos e fanfarrões.
• “A arte consiste em captar a essência dos tipos , conseguindo, a cada
vez, renovar-lhes o frescor e a comicidade. A final, o ser humano é o
mesmo animal, seja segurando um tacape ou apertando o botão de
uma bomba nuclear.”
Charlatões – A palavra que diverte e vende
• A vida é dura, sempre foi. Sobreviver da arte exige pericia, destreza e habilidades,
muitas vezes malícia e malandragem para arrancar “alguns” dos trouxas e garantir o
leite das crianças.
• Alguns charlatões eram tão talentosos que acabaram entrando para a história da
arte, e seus truques e gracejos sendo utilizados por cômicos de todos os estilos
como forma de entreter o público.
A arte de Tabarin
• Antoine Girard, o Tabarin, passou para a história como o exemplo de palhaço
charlatão.
• Ele esquentava a plateia. Dizia bobagens, contava histórias absurdas, brincava com
um macaco adestrado.
• Tabarin ficou famoso por suas estapafúrdias questões: Qual a diferença entre a
mulher e a garrafa? Quem não usa luvas no inverno? ...
• Tabarin ficou famoso também por seu chapéu , conseguia fazer 52 personagens
diferentes apenas modificando o formato do chapéu.
• Com o sucesso, ganhou muito dinheiro e teve suas histórias vendidas em pequenos
panfletos e mais tarde em livros.
O Clown e o Palhaço de Circo • Clown é a palavra inglesa derivada de
colonus e clod, palavras de origem latina
que designam os que cultivam a terra, a
mesma origem da portuguesa colono.
Clown é o camponês rústico, um roceiro,
um simples, um simplório, em estúpido
caipira.
O Circo e o Palhaço de Circo
• Em 1768, o Sargento inglês Philip Astley,
construiu um anfiteatro a céu aberto
onde pela manhã dava aulas de hipismo,
e tarde apresentava espetáculos
equestres.
• Num picadeiro de 13 metros de
diâmetro mesclou equestres com as
proezas dos artistas de feiras.
• Os 13 metros são a medida ideal para
que a força centrífuga ajude o cavaleiro
a manter-se em pé sobre o cavalo.
• O espetáculo seguia uma estrutura marcial: cavalos, cavaleiros, equilibristas, funâmbulos e
acrobatas exibiam-se ao som do rufar dos tambores. Vestiam-se com uniformes militares.
• Um espetáculo baseado na disciplina militar e na valorização da destreza e do perigo deixava
a plateia muito tensa, era preciso criar um momento de relaxamento, deixando o espectador
aliviado. É ai que surge o palhaço de circo.
Os espetáculos de Circo no final dos 700 e inicio dos 800.
• Os primeiros espetáculos de circo eram uma mescla de teatro e picadeiro de equitação,
apresentando pantomimas, melodramas. Um espetáculo no Circo Astley, nos primeiros anos
durava de 5 à 6 horas.
Os primeiros Palhaços de Circo
• A comicidade nos espetáculos de Astley – Franconi e Hugues – os pioneiros do circo
moderno, estava dividida entre duas figuras: o Palhaço a cavalo e o palhaço de cena.
O Palhaço a cavalo
• O Cômico a cavalo era uma tradição antiga nas escolas de equitação e nos treinamentos
militares. Um exímio cavaleiro divertia a tropa e os amigos mostrando as inúmeras
possibilidades de se montar errado em um cavalo.
O Palhaço de Cena
• O Palhaço de cena foi considerado um “personagem cômico novo”, porque a ele foi
permitido mesclar o palhaço de feira, os diferentes tipos de criados da commedia dell’arte e
as cenas tradicionais de clown.
• O circo moderno nasceu com a mística de ser um espetáculo diferente, onde o público veria
o inusitado das feiras, com requinte e a classe de um espetáculo de teatro.
• O mestre de pista é um personagem fundamental para a estrutura de um espetáculo de
variedades como é o circo tradicional. Uma figura que representa o poder, a ordem e o
equilíbrio é o contraponto perfeito para o palhaço. Nasce a primeira dupla de cômicos
tipicamente circense. O mestre de pista e o palhaço.
A Lenda do nascimento de Augusto
• Conta a lenda que, em 1869, Renz, diretor do circo alemão, que levava o seu nome, furioso
com sua equipe de cavalariços, começou a berrar por trás das cortinas durante um
espetáculo. Um jovem tratador, chamado Tom Belling, ai tentar fugir, acabou se atrapalhando
e entrou em cena. Nervoso, tropeçou nos tapetes, caiu no chão e foi expulso pelos artistas
com um belo pé na bunda. O público rio e começou a gritar – Auguste (idiota, na gíria alemã
da época). Vendo aquilo, Renz percebeu o talento dramático do jovem Belling e as
possibilidades cômicas do personagem auxiliar idiota e atrapalhado, a quem chamou
Augusto.
• Existem diferentes versões.
• Essa história não é verdadeira, e despreza a genialidade dos comediantes, como se tudo
fosse fruto do acaso, de geração espontânea.
• Ao longo da história e ao redor do mundo, vamos encontrar Augusto’s de diferentes
figurinos e máscaras .
• O Augusto era um idiota, um inadequado, alguém que queria se vestir bem, mas não sabia
como.
Comicidade Física
• É aquela que se baseia fundamentalmente na agilidade, pericia, elasticidade e ritmo dos
tombos, tapas. Pontapés, saltos, quedas e rolamentos. O palhaço tem que ser, antes de tudo,
um exímio acrobata e ter a inteligência e o talento de dar um simples tropeço a graça e a
comicidade de uma tirada de gênio.
E NO BRASIL... • O Brasil começou - com uma festa! Índios
e portugueses dançando juntos, de mãos
dadas, ao som de uma gaita. E quem
armou a grande roda foi um palhaço.
Diogo Dias, o cômico gracioso que viajava
com Pedro Álvares Cabral e que, no
Domingo de Páscoa, no início da tarde,
resolveu tomar a mão dos índios e dançar
com eles.
• Diogo Dias foi uma figura importante
neste início das relações entre
portugueses e índios. Além de fazer a
primeira festa do Brasil, logo depois da
primeira Missa, foi designado pelo
capitão Pedro Álvares Cabral para
participar de diversas missões de contato
com os índios “por ser homem alegre,
com que eles folgavam”, como diz
Caminha.
• Quem dera a relação portugueses x índios
tivesse sido sempre comandada pelos
palhaços...
O Circo no Brasil
• O termo “Circo”, assim como “Teatro”, pode referir-se ao gênero de espetáculo ou à casa
de espetáculos, o que por vezes causa grandes confusões.
• O palhaço brasileiro foi gestado nas festas do Brasil Colônia. Nascimentos, batizados,
casamentos e funerais da família real; dias santificados; chegada de bispos e autoridades
em geral – tudo era motivo para procissões, missas e... festas.
• Muito comuns eram os espetáculos realizados na forma de cortejo, com carros
alegóricos, desfiles, figurinos especiais e música – uma espécie de desfile de escola de
samba da época....
O Circo no Século XIX
• No Rio de Janeiro, capital do Império, existiram casas de espetáculos com atividades
permanentes, ou quase, dedicadas especialmente a espetáculos circenses. Não sabemos
exatamente quando foi construída a primeira delas mas, em 1837, quando pela primeira
vez exibiu-se um elefante no Brasil, o público curioso pode vê-lo no Circo Olímpico.
Um jeito brasileiro de ser palhaço!
• Pouco a pouco foi se formando um jeito
brasileiro de ser palhaço. A mistura de
culturas que caracteriza o Brasil - somada a
uma imensa capacidade de rir de si
mesmo e à bagunça institucionalizada - são
a base do nosso humor. Como bem dizia o
Barão do Rio Branco – “Há somente duas
coisas bem organizadas no Brasil: a
desordem e o carnaval”.
• 0 Brasil tem o seu próprio estilo de humor.
Somos espalhafatosos, falantes, cheios de
ginga e malícia; sedutores, descarados,
bem humorados, afinados e temos um
ritmo....
• Sabemos que nada disso é verdade, mas
não importa; são mentiras como essas que
formam a nossa identidade cultural.
• Até nossa tristeza é diferente. E a música?
• As festas populares, muitas das quais
permanecem vivas entre nós até hoje, são
fundamentais na formação da comicidade
brasileira
Em linguagem de preto, surge o palhaço brasileiro
• Anúncios: “grupos, elasticidades, saltos mortaes, lutas e cantoria em linguagem de preto,
além de um palhaço muito bom.”
• “o palhaço, vestido a caráter com sua viola, cantará em língua de preto algumas de suas
modinhas…”
• Não soa nada estranho em uma sociedade escravocrata que o negro se torne um elemento
cômico, risível e ridicularizável. E a associação dos negros com as figuras de cantores, músicos
e com cantorias também faz sentido se pensarmos na contribuição dos africanos para a
nossa cultura musical.
• Os blackfaces eram cômicos brancos (EUA), com a cara pintada de negro, que apresentavam-
se em circos e espetáculos itinerantes por todos o país, fazendo humor com a música, as
danças e a “língua” dos negros. Este personagem, era a personificação do ódio e da
intolerância racial.
• Creio que os dados de que dispomos sobre os palhaços no Brasil ainda são insuficientes para
que se possa ter uma explicação clara e definitiva sobre como e por que surgiram, por aqui,
os palhaços pintados de negro.
• Quanto ao papel dos negros no circo e especialmente como palhaços as referências são
escassas. Os anúncios, maior fonte de pesquisa, costumam referir-se apenas ao palhaço, sem
citar nomes e, muitas vezes, sem sequer dar o nome de palhaço do palhaço…
O Palhaço dos Mamulengos
• A figura cômica é um dos pontos altos do teatro de bonecos e, se estudarmos especialmente
o Mamulengo nordestino, veremos o forte parentesco entre os palhaços de picadeiro e as
figuras da empanada. No Teatro de Mamulengo, dá-se o nome de empanada ao palco por
trás do qual trabalha o mestre, alternando- se na manipulação de inúmeros bonecos, cada
qual com voz e personalidade próprias.
• Na estrutura dos enredos do Teatro de Mamulengo encontramos muitas semelhanças com a
Commedia dell’arte: roteiros simples, personagens caricatos e muito espaço para a
improvisação.
• A comicidade é geral, todos os bonecos são personagens cômicos. Mas quem faz o palhaço
central, o grande cômico, é o boneco principal, que é quase um alter ego do mestre
mamulengueiro.
A FESTA CONTINUA
Os palhaços do século XXI
• Vivemos hoje uma época em que se
multiplicam os tipos e as formas de ser
palhaço. Há palhaços no cinema, na
televisão, no meio da rua vendendo as
maravilhas de alguma liquidação,
palhaços de hospital, de presídio,
palhaços de palco e os de picadeiro. Há
cursos de palhaço, oficinas, encontros,
seminários, teses de mestrado e muitos
livros sobre o assunto.
• O circo talvez tenha sido o último
segmento artístico a render-se à
educação formal.
• A institucionalização da formação do artista tem inúmeras desvantagens, mas – há que se
reconhecer – democratizou e universalizou a informação e contribuiu para derrubar
preconceitos quanto à moral dos artistas. Só que o circo ficou à margem desse inexorável
processo de organização e transmissão do conhecimento que atingiu todas as profissões,
acabando com as confrarias e com os guetos de artífices e artistas.
• O saber circense continuou sendo passado de pai para filho e de mestre para discípulos por
meio do exemplo e de treinamento duro e repetitivo até os anos 80 do século passado.
• Os artistas revolucionários da jovem União Soviética mergulharam de cabeça na busca da
essência da arte popular.
• A escola soviética de circo renovou a linguagem das artes circenses, investindo em tecnologia
e no desenvolvimento de uma estética própria de movimentos limpos, bem definidos, com
uma forte base de ballet clássico, uma disciplina rígida e conhecimentos científicos de
fisiologia e bio-mecânica.
Do lado de cá
• Enquanto soviéticos, chineses e demais países da ala comunista valorizavam o circo e
investiam na criação de escolas que inovassem respeitando a tradição, os ocidentais
deixavam a arte circense ser quase engolida pela televisão e pelo fenômeno dos espetáculos
de massa.
• Espetáculo custoso, o circo não é um empreendimento para amadores. Mesmo os pequenos
e pobres circos de periferia exigem uma administração cuidadosa e corajosa. Afogado em
dificuldades econômicas, e alijado das políticas públicas para a cultura, a maioria dos
empresários circenses preferiu apostar no conhecido, não se arriscar em inovações artísticas,
manter uma folha de pagamento modesta e um espetáculo sem grandes surpresas.
• O negócio era agradar e garantir a bilheteria, o que provou ser uma péssima escolha a longo
prazo. O circo, salvo poucas exceções, transformou-se num espetáculo previsível, datado e
repetitivo. Programa para se levar as crianças uma vez ao ano, e pronto. Esse fenômeno
ocorreu em todo o ocidente. Lentamente o circo virou um espetáculo obrigatório, mas uma
ida especial e anual bastava. Afinal, “era tudo a mesma coisa”.
E a Palhaça quem é?
• Diziam os tradicionais que mulher não podia ser palhaço.
• A Mulher era vista como um Homem incompleto e muito perigoso. Como uma figura dessas
podia ter o poder de provocar o riso? Era possível rir da mulher, mas não com a mulher.
Afinal, rir junto, rir com, é coisa que só se permite aos iguais, o que homens e mulheres não
eram e não podiam ser.
• As que se sobressaíram foram tratadas como putas. Nunca é demais lembrar que os artistas
em geral eram considerados pessoas não confiáveis, que em diferentes períodos sofreram
severas restrições, não podendo nem mesmo ser enterrados em Campo Santo. Com as
mulheres artistas tudo era pior.
• Falar da sexualidade do palhaço é assunto complexo. Alguns palhaços são claramente
masculinos; outros, no entanto, são tão líricos e inocentes que deixam longe essas questões
de gênero e sexo, que parecem não ter qualquer importância na construção da persona-
palhaço.
• A palhaça é um tipo cômico novo. Algo próprio do final do século XX e que parece ter um
brilhante futuro no século XXI.
A ÉTICA DO PALHAÇO
• “Hay límites. Yo no los conosco, pero que los
hay, los hay”.
• O riso pode ser transgressor ou opressor. O
riso liberta e reprime. Tudo depende do
momento e de como e quem o provoca e para
quem, com quem e de quem se ri.
• O palhaço é diferente do comediante. Ele não
conta uma história engraçada. Ele é a graça,
ele é o risível.
• O contraponto para o deboche repressor e
constrangedor é a sensibilidade e a
consciência do cômico, daquele que pretende
provocar o riso alheio. Judeus são os
melhores contadores de piadas de judeus,
assim como as melhores farpas e ironias
sobre bichinhas foram as que ouvi contadas
por homossexuais.
• A grande diferença entre humilhar e brincar é
a que existe entre rir de e rir com.
Elogio da Bobagem - Palhaços no Brasil e no Mundo

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Elogio da Bobagem - Palhaços no Brasil e no Mundo

  • 1. FACULDADES MONTEIRO LOBATO – FATO CURSO DE PRODUÇÃO CÊNICA Seminário – Alice Viveiros de Castro ELOGIO DA BOBAGEM – Palhaços no Brasil e no mundo Elementos Estéticos e Técnicos do Circo Izadora Fontoura Jonas Piccoli Renata Zonatto Porto Alegre, 2014
  • 2. “O Palhaço é a figura cômica por excelência. Ele é a mais enlouquecida expressão da comicidade: é tragicamente cômico. Tudo que é alucinante, violento, excêntrico e absurdo é próprio do palhaço. Ele não tem nenhum compromisso com qualquer aparência de realidade. O palhaço é comicidade pura.”pág 11
  • 3. • O palhaço não é um personagem exclusivo do circo. Mas foi dentro do picadeiro que ele se tornou mais conhecido e se tornou protagonista. • Umas das grandes dificuldades dos autores que estudam a origem dos palhaços, está nos nomes que os palhaços assumem em cada momento e lugar. Clown – Grotesco – Truão – Bobo – Excêntrico – Tony – Augusto – Jogral... • Em português temos um nome comum para todas as possíveis formas assumidas por essa figura: PALHAÇO • E não importa se sua cabeleira é vermelha e os sapatos enormes ou se ele está sem nenhuma maquiagem. Identificamos um palhaço não apenas pela forma, mas principalmente pela sua capacidade de nos colocar, como espectadores.
  • 4. PALHAÇOS SAGRADOS E PROFANOS O Riso e a Razão • “O homem é o único animal que ri” - disse Aristóteles • A capacidade de rir nos aproxima de Deus. • Rimos com a inteligência, é preciso compreender para achar graça. • O riso pressupõe uma relação de cumplicidade e o conhecimento de inúmeras e sutis informações prévias.
  • 5. • Millôr Fernandes complementou Aristóteles dizendo que “o homem é o único animal que ri e é rindo que ele mostra o animal que é” • “A principal função do riso é nos recolocar diante da nossa mais pura essência: somos animais. Nem deuses nem semi-deuses, meras bestas tontas que comem, bebem, amam e lutam desesperadamente para sobreviver. A consciência disso é que nos faz únicos, humanos.” pág 15 • A frase de Millôr nos traz também outras leituras. Existe ética no riso? Rimos de qualquer coisa? E onde fica o politicamente correto tão em voga nos nossos tempos? Piadas sexistas, racistas, excludentes, reforçadoras de preconceitos provocam o riso? Claro que sim. O ser humano é uma besta, não é mesmo?
  • 6. O Riso e o Rito • O palhaço está presente em todas as culturas, e a mais antiga expressão do personagem é a que se faz presente nos rituais sagrados. Desde o início dos tempos, o riso foi e ainda é utilizado como elemento ritual para espantar o medo, especialmente o medo da morte. • O diabo - ícone do Mal - assume inúmeras vezes um papel cômico. Ridicularizar o Mal é uma das melhores formas de vencê-lo... • Na Cultura Ioruba as seis máscaras da cerimônia Egun-gun são um corcunda, um albino, um leproso, um prognata, um anão e um aleijado, figuras presentes entre os bufões de todos os tempos. • Os índios norte-americanos têm a figura dos heyokas, lembra a tribo o absurdo dos comportamentos humanos e a necessidade de não levar as regras demasiadamente a sério • Os calmos monges budistas tibetanos têm a figura de Mi- tshe-ring - o velho bufão sábio que atrapalha todas as solenes cerimônias religiosas, incapaz de se controlar e de fazer silêncio.
  • 7. Uma das mais antigas profissões • Cômico. • Ricos ostentavam o seu palhaço exclusivo. • Trabalhavam em casamentos, batizados, aniversários e festas para os deuses Egito • Os faraós nobres não viviam sem um bufão ao seu lado. • Eram autorizados a contradizer e ridicularizar o próprio faraó, mas nem sempre os poderosos aceitavam bem as brincadeiras e o castigo vinha rápido e definitivo: a morte. • Normalmente eram anões e corcundas. A deformidade lhes colocava em posição de inferioridade, o que facilitava a aceitação do comportamento ousado. Algo que não deve ser levado a sério – só uma piada. China • A China tem o mais antigo personagem cômico ainda em atividade: o Macaco da Ópera chinesa – através de suas trapalhadas é responsável por corrigir a história desmascarando o mal e premiando as boas intenções.
  • 8. Índia Vidusaka é um careca manico, quase anão, de dentes proeminentes e olhos vermelhos. Um dos seus versos favoritos é: “Abençoados sejam os que estão embriagados de bebida, abençoados os bêbados de bebida, abençoados os encharcados de bebida e abençoados todos os que estão afogados na bebida!” História de Birbal Numa noite de tédio o Imperador da um tapa na cara de Birbal, sem motivo nenhum. Imediatamente Birbal se vira para o nobre que está mais próximo e lhe dá um tapa na cara igual ao que recebeu, o nobre era novo na corte e achando que era uma brincadeira, deu um tapa na pessoa que estava ao seu lado, e assim o tapa voltou para o imperador. “É um jogo. Você recebe um tapa e passa adiante. A única regra é que não se pode bater na pessoa que lhe bateu, cada um bate numa outra pessoa. Como foi você quem começou, agora o círculo se fechou, o ciclo se cumpriu...” Grêcia Os pregos tinham a figura dos parasitas – significava conviva, aquele que alegrava um banquete. • A história guardou o nome de Philipos, exímio imitador que arrancava gargalhadas. Sócrates tentou calá-lo, mas o parasita imitou-o com tal perfeição que quem teve que se calar foi o filósofo.
  • 9. Os Mimos • O teatro começa na Grécia com peças curtas, representadas pelas trupes ambulantes vindas da região Dórica. • Os palhaços Dóricos, assim como as peças curtas, são chamados de mimos. Hoje o termo é associado a mímica e a pantomima. • Ato de imitar – os artistas se especializavam em imitar personalidades da sociedade da época. Roma • Todo nobre mantinha em sua casa uma trupe de palhaços anões. Dizia-se que ter um anão em casa dava sorte. • Anões, corcundas e feios tinham no humor uma possibilidade de sobrevivência e de ascensão social. • Uma simples resposta bem dada, transformava um anão palhaço num sábio.
  • 10. O Cômico na Idade Média e no Renascentismo • Quando o Império Romano se torna cristão os artistas sofrem muito, especialmente os artistas do riso e das diversões em geral. • Os artistas viram bandos itinerantes, apresentando-se em castelos, em feiras e festas de aldeia. • Durante muitos séculos , só teremos notícias de espetáculos religiosos.
  • 11. O Mundo ao Contrário, a Festa dos Loucos e dos Asnos • Em Roma, uma velha tradição banida pela igreja volta com força total. As saturnais – os escravos vestiam-se como os patrões, sentavam-se a mesa com eles e celebravam a “Idade de Ouro”, aquela em que a igualdade imperava e todos os homens confraternizavam em harmonia. • Na Europa Medieval, as saturnais foram transformadas na “Festa dos Loucos”, quando os estudantes e membros inferiores do clero invertem a hierarquia e instalam a esbórnia nas igrejas. • Elegiam um bispo, rezavam uma missa cômica, com versões satíricas e picantes das rezas. Os padres eram extravagantes, com roupas femininas, cantavam, jogavam cartas e dados. Isso tudo dentro das igrejas e em torno delas. • Em alguns lugares era chamada a “Festa dos Asnos” – quando um burro era sagrado bispo. • Um mundo ao contrário, onde tudo virava de ponta cabeça, as regras se invertiam e os poderes também.
  • 12. Os Bobos da Corte na Idade Média • Na cabeça um chapéu cheio de longas pontas com guizos em cada uma delas. Na mão um cetro – símbolo da loucura. A roupa é colorida, com triângulos de cores diferentes. Na cintura, uma espada de madeira e um bastão com uma bexiga de porco cheia de ervilhas secas. • Os bobos usavam, preferencialmente verde e amarelo. • Mulheres também exerciam o oficio.
  • 13. Os Saltimbancos e as Feiras • Depois que os grandes circos romanos foram abandonados, por muitos anos a Europa não viu nada que pudesse chamar de espetáculo circense. • Pouco a pouco a igreja começa a incentivar a realização de espetáculos que contam a vida de Cristo e dos santos. No inicio eram pequenas apresentações dentro das igrejas, mas a coisa foi crescendo, tomou as ruas, e ao final, envolvia toda a cidade. • Esse fenômeno artístico aconteceu estreitamente ligado ao crescimento das feiras. • Para chamar a atenção, armava-se um pequeno tablado – tipo um banco – e, encima dele, eram realizados os espetáculos . Vem daí o termo saltimbanco, “Saltare in banco”. • No inicio bastava um banco, depois um tablado com cortinas e, mais tarde, foram sendo construídos verdadeiros teatros.
  • 14. Commedia Dell’ arte • O termo Commedia Dell’arte surge no início do século XVI como forma de diferenciar o tradicional espetáculo popular beseado na improvisação e na habilidade dos atores – da commedia erudita, o teatro culto. • Personagens estúpidos, maridos traídos, velhos babões, avarentos e fanfarrões. • “A arte consiste em captar a essência dos tipos , conseguindo, a cada vez, renovar-lhes o frescor e a comicidade. A final, o ser humano é o mesmo animal, seja segurando um tacape ou apertando o botão de uma bomba nuclear.”
  • 15. Charlatões – A palavra que diverte e vende • A vida é dura, sempre foi. Sobreviver da arte exige pericia, destreza e habilidades, muitas vezes malícia e malandragem para arrancar “alguns” dos trouxas e garantir o leite das crianças. • Alguns charlatões eram tão talentosos que acabaram entrando para a história da arte, e seus truques e gracejos sendo utilizados por cômicos de todos os estilos como forma de entreter o público. A arte de Tabarin • Antoine Girard, o Tabarin, passou para a história como o exemplo de palhaço charlatão. • Ele esquentava a plateia. Dizia bobagens, contava histórias absurdas, brincava com um macaco adestrado. • Tabarin ficou famoso por suas estapafúrdias questões: Qual a diferença entre a mulher e a garrafa? Quem não usa luvas no inverno? ... • Tabarin ficou famoso também por seu chapéu , conseguia fazer 52 personagens diferentes apenas modificando o formato do chapéu. • Com o sucesso, ganhou muito dinheiro e teve suas histórias vendidas em pequenos panfletos e mais tarde em livros.
  • 16. O Clown e o Palhaço de Circo • Clown é a palavra inglesa derivada de colonus e clod, palavras de origem latina que designam os que cultivam a terra, a mesma origem da portuguesa colono. Clown é o camponês rústico, um roceiro, um simples, um simplório, em estúpido caipira. O Circo e o Palhaço de Circo • Em 1768, o Sargento inglês Philip Astley, construiu um anfiteatro a céu aberto onde pela manhã dava aulas de hipismo, e tarde apresentava espetáculos equestres. • Num picadeiro de 13 metros de diâmetro mesclou equestres com as proezas dos artistas de feiras. • Os 13 metros são a medida ideal para que a força centrífuga ajude o cavaleiro a manter-se em pé sobre o cavalo.
  • 17. • O espetáculo seguia uma estrutura marcial: cavalos, cavaleiros, equilibristas, funâmbulos e acrobatas exibiam-se ao som do rufar dos tambores. Vestiam-se com uniformes militares. • Um espetáculo baseado na disciplina militar e na valorização da destreza e do perigo deixava a plateia muito tensa, era preciso criar um momento de relaxamento, deixando o espectador aliviado. É ai que surge o palhaço de circo.
  • 18. Os espetáculos de Circo no final dos 700 e inicio dos 800. • Os primeiros espetáculos de circo eram uma mescla de teatro e picadeiro de equitação, apresentando pantomimas, melodramas. Um espetáculo no Circo Astley, nos primeiros anos durava de 5 à 6 horas. Os primeiros Palhaços de Circo • A comicidade nos espetáculos de Astley – Franconi e Hugues – os pioneiros do circo moderno, estava dividida entre duas figuras: o Palhaço a cavalo e o palhaço de cena. O Palhaço a cavalo • O Cômico a cavalo era uma tradição antiga nas escolas de equitação e nos treinamentos militares. Um exímio cavaleiro divertia a tropa e os amigos mostrando as inúmeras possibilidades de se montar errado em um cavalo.
  • 19. O Palhaço de Cena • O Palhaço de cena foi considerado um “personagem cômico novo”, porque a ele foi permitido mesclar o palhaço de feira, os diferentes tipos de criados da commedia dell’arte e as cenas tradicionais de clown. • O circo moderno nasceu com a mística de ser um espetáculo diferente, onde o público veria o inusitado das feiras, com requinte e a classe de um espetáculo de teatro. • O mestre de pista é um personagem fundamental para a estrutura de um espetáculo de variedades como é o circo tradicional. Uma figura que representa o poder, a ordem e o equilíbrio é o contraponto perfeito para o palhaço. Nasce a primeira dupla de cômicos tipicamente circense. O mestre de pista e o palhaço.
  • 20. A Lenda do nascimento de Augusto • Conta a lenda que, em 1869, Renz, diretor do circo alemão, que levava o seu nome, furioso com sua equipe de cavalariços, começou a berrar por trás das cortinas durante um espetáculo. Um jovem tratador, chamado Tom Belling, ai tentar fugir, acabou se atrapalhando e entrou em cena. Nervoso, tropeçou nos tapetes, caiu no chão e foi expulso pelos artistas com um belo pé na bunda. O público rio e começou a gritar – Auguste (idiota, na gíria alemã da época). Vendo aquilo, Renz percebeu o talento dramático do jovem Belling e as possibilidades cômicas do personagem auxiliar idiota e atrapalhado, a quem chamou Augusto. • Existem diferentes versões. • Essa história não é verdadeira, e despreza a genialidade dos comediantes, como se tudo fosse fruto do acaso, de geração espontânea. • Ao longo da história e ao redor do mundo, vamos encontrar Augusto’s de diferentes figurinos e máscaras . • O Augusto era um idiota, um inadequado, alguém que queria se vestir bem, mas não sabia como.
  • 21. Comicidade Física • É aquela que se baseia fundamentalmente na agilidade, pericia, elasticidade e ritmo dos tombos, tapas. Pontapés, saltos, quedas e rolamentos. O palhaço tem que ser, antes de tudo, um exímio acrobata e ter a inteligência e o talento de dar um simples tropeço a graça e a comicidade de uma tirada de gênio.
  • 22. E NO BRASIL... • O Brasil começou - com uma festa! Índios e portugueses dançando juntos, de mãos dadas, ao som de uma gaita. E quem armou a grande roda foi um palhaço. Diogo Dias, o cômico gracioso que viajava com Pedro Álvares Cabral e que, no Domingo de Páscoa, no início da tarde, resolveu tomar a mão dos índios e dançar com eles. • Diogo Dias foi uma figura importante neste início das relações entre portugueses e índios. Além de fazer a primeira festa do Brasil, logo depois da primeira Missa, foi designado pelo capitão Pedro Álvares Cabral para participar de diversas missões de contato com os índios “por ser homem alegre, com que eles folgavam”, como diz Caminha. • Quem dera a relação portugueses x índios tivesse sido sempre comandada pelos palhaços...
  • 23. O Circo no Brasil • O termo “Circo”, assim como “Teatro”, pode referir-se ao gênero de espetáculo ou à casa de espetáculos, o que por vezes causa grandes confusões. • O palhaço brasileiro foi gestado nas festas do Brasil Colônia. Nascimentos, batizados, casamentos e funerais da família real; dias santificados; chegada de bispos e autoridades em geral – tudo era motivo para procissões, missas e... festas. • Muito comuns eram os espetáculos realizados na forma de cortejo, com carros alegóricos, desfiles, figurinos especiais e música – uma espécie de desfile de escola de samba da época.... O Circo no Século XIX • No Rio de Janeiro, capital do Império, existiram casas de espetáculos com atividades permanentes, ou quase, dedicadas especialmente a espetáculos circenses. Não sabemos exatamente quando foi construída a primeira delas mas, em 1837, quando pela primeira vez exibiu-se um elefante no Brasil, o público curioso pode vê-lo no Circo Olímpico.
  • 24. Um jeito brasileiro de ser palhaço! • Pouco a pouco foi se formando um jeito brasileiro de ser palhaço. A mistura de culturas que caracteriza o Brasil - somada a uma imensa capacidade de rir de si mesmo e à bagunça institucionalizada - são a base do nosso humor. Como bem dizia o Barão do Rio Branco – “Há somente duas coisas bem organizadas no Brasil: a desordem e o carnaval”. • 0 Brasil tem o seu próprio estilo de humor. Somos espalhafatosos, falantes, cheios de ginga e malícia; sedutores, descarados, bem humorados, afinados e temos um ritmo.... • Sabemos que nada disso é verdade, mas não importa; são mentiras como essas que formam a nossa identidade cultural. • Até nossa tristeza é diferente. E a música? • As festas populares, muitas das quais permanecem vivas entre nós até hoje, são fundamentais na formação da comicidade brasileira
  • 25. Em linguagem de preto, surge o palhaço brasileiro • Anúncios: “grupos, elasticidades, saltos mortaes, lutas e cantoria em linguagem de preto, além de um palhaço muito bom.” • “o palhaço, vestido a caráter com sua viola, cantará em língua de preto algumas de suas modinhas…” • Não soa nada estranho em uma sociedade escravocrata que o negro se torne um elemento cômico, risível e ridicularizável. E a associação dos negros com as figuras de cantores, músicos e com cantorias também faz sentido se pensarmos na contribuição dos africanos para a nossa cultura musical. • Os blackfaces eram cômicos brancos (EUA), com a cara pintada de negro, que apresentavam- se em circos e espetáculos itinerantes por todos o país, fazendo humor com a música, as danças e a “língua” dos negros. Este personagem, era a personificação do ódio e da intolerância racial. • Creio que os dados de que dispomos sobre os palhaços no Brasil ainda são insuficientes para que se possa ter uma explicação clara e definitiva sobre como e por que surgiram, por aqui, os palhaços pintados de negro. • Quanto ao papel dos negros no circo e especialmente como palhaços as referências são escassas. Os anúncios, maior fonte de pesquisa, costumam referir-se apenas ao palhaço, sem citar nomes e, muitas vezes, sem sequer dar o nome de palhaço do palhaço…
  • 26. O Palhaço dos Mamulengos • A figura cômica é um dos pontos altos do teatro de bonecos e, se estudarmos especialmente o Mamulengo nordestino, veremos o forte parentesco entre os palhaços de picadeiro e as figuras da empanada. No Teatro de Mamulengo, dá-se o nome de empanada ao palco por trás do qual trabalha o mestre, alternando- se na manipulação de inúmeros bonecos, cada qual com voz e personalidade próprias. • Na estrutura dos enredos do Teatro de Mamulengo encontramos muitas semelhanças com a Commedia dell’arte: roteiros simples, personagens caricatos e muito espaço para a improvisação. • A comicidade é geral, todos os bonecos são personagens cômicos. Mas quem faz o palhaço central, o grande cômico, é o boneco principal, que é quase um alter ego do mestre mamulengueiro.
  • 27. A FESTA CONTINUA Os palhaços do século XXI • Vivemos hoje uma época em que se multiplicam os tipos e as formas de ser palhaço. Há palhaços no cinema, na televisão, no meio da rua vendendo as maravilhas de alguma liquidação, palhaços de hospital, de presídio, palhaços de palco e os de picadeiro. Há cursos de palhaço, oficinas, encontros, seminários, teses de mestrado e muitos livros sobre o assunto. • O circo talvez tenha sido o último segmento artístico a render-se à educação formal.
  • 28. • A institucionalização da formação do artista tem inúmeras desvantagens, mas – há que se reconhecer – democratizou e universalizou a informação e contribuiu para derrubar preconceitos quanto à moral dos artistas. Só que o circo ficou à margem desse inexorável processo de organização e transmissão do conhecimento que atingiu todas as profissões, acabando com as confrarias e com os guetos de artífices e artistas. • O saber circense continuou sendo passado de pai para filho e de mestre para discípulos por meio do exemplo e de treinamento duro e repetitivo até os anos 80 do século passado. • Os artistas revolucionários da jovem União Soviética mergulharam de cabeça na busca da essência da arte popular. • A escola soviética de circo renovou a linguagem das artes circenses, investindo em tecnologia e no desenvolvimento de uma estética própria de movimentos limpos, bem definidos, com uma forte base de ballet clássico, uma disciplina rígida e conhecimentos científicos de fisiologia e bio-mecânica.
  • 29. Do lado de cá • Enquanto soviéticos, chineses e demais países da ala comunista valorizavam o circo e investiam na criação de escolas que inovassem respeitando a tradição, os ocidentais deixavam a arte circense ser quase engolida pela televisão e pelo fenômeno dos espetáculos de massa. • Espetáculo custoso, o circo não é um empreendimento para amadores. Mesmo os pequenos e pobres circos de periferia exigem uma administração cuidadosa e corajosa. Afogado em dificuldades econômicas, e alijado das políticas públicas para a cultura, a maioria dos empresários circenses preferiu apostar no conhecido, não se arriscar em inovações artísticas, manter uma folha de pagamento modesta e um espetáculo sem grandes surpresas. • O negócio era agradar e garantir a bilheteria, o que provou ser uma péssima escolha a longo prazo. O circo, salvo poucas exceções, transformou-se num espetáculo previsível, datado e repetitivo. Programa para se levar as crianças uma vez ao ano, e pronto. Esse fenômeno ocorreu em todo o ocidente. Lentamente o circo virou um espetáculo obrigatório, mas uma ida especial e anual bastava. Afinal, “era tudo a mesma coisa”.
  • 30. E a Palhaça quem é? • Diziam os tradicionais que mulher não podia ser palhaço. • A Mulher era vista como um Homem incompleto e muito perigoso. Como uma figura dessas podia ter o poder de provocar o riso? Era possível rir da mulher, mas não com a mulher. Afinal, rir junto, rir com, é coisa que só se permite aos iguais, o que homens e mulheres não eram e não podiam ser. • As que se sobressaíram foram tratadas como putas. Nunca é demais lembrar que os artistas em geral eram considerados pessoas não confiáveis, que em diferentes períodos sofreram severas restrições, não podendo nem mesmo ser enterrados em Campo Santo. Com as mulheres artistas tudo era pior. • Falar da sexualidade do palhaço é assunto complexo. Alguns palhaços são claramente masculinos; outros, no entanto, são tão líricos e inocentes que deixam longe essas questões de gênero e sexo, que parecem não ter qualquer importância na construção da persona- palhaço. • A palhaça é um tipo cômico novo. Algo próprio do final do século XX e que parece ter um brilhante futuro no século XXI.
  • 31. A ÉTICA DO PALHAÇO • “Hay límites. Yo no los conosco, pero que los hay, los hay”. • O riso pode ser transgressor ou opressor. O riso liberta e reprime. Tudo depende do momento e de como e quem o provoca e para quem, com quem e de quem se ri. • O palhaço é diferente do comediante. Ele não conta uma história engraçada. Ele é a graça, ele é o risível. • O contraponto para o deboche repressor e constrangedor é a sensibilidade e a consciência do cômico, daquele que pretende provocar o riso alheio. Judeus são os melhores contadores de piadas de judeus, assim como as melhores farpas e ironias sobre bichinhas foram as que ouvi contadas por homossexuais. • A grande diferença entre humilhar e brincar é a que existe entre rir de e rir com.