O recurso eleitoral questiona uma matéria jornalística publicada em 2012 sobre fatos de 1992. A sentença foi mantida por entender que a matéria não tem contemporaneidade com as eleições de 2020 e não configura ilícito eleitoral, já que se baseia em fatos antigos e exercício do direito à livre manifestação.
1. 23/10/2020
Número: 0600035-72.2020.6.26.0002
Classe: RECURSO ELEITORAL
Órgão julgador colegiado: Colegiado do Tribunal Regional Eleitoral
Órgão julgador: Gabinete do Juiz Manuel Marcelino
Última distribuição : 16/10/2020
Valor da causa: R$ 0,00
Processo referência: 0600035-72.2020.6.26.0002
Assuntos: Cargo - Prefeito, Propaganda Política - Propaganda Eleitoral - Internet, Representação,
Propaganda Política - Propaganda Eleitoral - Divulgação de Notícia Sabidamente Falsa
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? NÃO
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? NÃO
Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo
PJe - Processo Judicial Eletrônico
Partes Procurador/Terceiro vinculado
CELSO UBIRAJARA RUSSOMANNO (RECORRENTE) RAFAEL LAGE FREIRE (ADVOGADO)
ARTHUR LUIS MENDONCA ROLLO (ADVOGADO)
ANA FLAVIA ALMEIDA GRANJO (ADVOGADO)
DANIELA LUGIA BRIGAGAO DE CARVALHO (ADVOGADO)
GUILHERME CESAR AMADUCCI (ADVOGADO)
NN&A PRODUCOES JORNALISTICAS LTDA - ME
(RECORRIDO)
FRANCISCO RAMOS (ADVOGADO)
CAROLINE NARCON PIRES DE MORAES (ADVOGADO)
FRANCISCO ROBERTO EMBOABA NOGUEIRA
(RECORRIDO)
FRANCISCO RAMOS (ADVOGADO)
CAROLINE NARCON PIRES DE MORAES (ADVOGADO)
PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL (FISCAL DA LEI)
Documentos
Id. Data da
Assinatura
Documento Tipo
19075
201
23/10/2020 19:31 Acórdão Acórdão
2. PUBLICADO EM SESSÃO
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO ESTADO DE SÃO PAULO
ACÓRDÃO
RECURSO ELEITORAL (11548) - 0600035-72.2020.6.26.0002 - São Paulo - SÃO PAULO
RELATOR(A): MANUEL PACHECO DIAS MARCELINO
RECORRENTE: CELSO UBIRAJARA RUSSOMANNO
Advogados do(a) RECORRENTE: RAFAEL LAGE FREIRE - SP0431951, ARTHUR LUIS
MENDONCA ROLLO - SP0153769, ANA FLAVIA ALMEIDA GRANJO - SP0445337, DANIELA
LUGIA BRIGAGAO DE CARVALHO - SP0374060, GUILHERME CESAR AMADUCCI - SP0435303
RECORRIDO: NN&A PRODUCOES JORNALISTICAS LTDA - ME, FRANCISCO ROBERTO
EMBOABA NOGUEIRA
Advogados do(a) RECORRIDO: FRANCISCO RAMOS - SP0328177, CAROLINE NARCON PIRES
DE MORAES - SP0345730
Advogados do(a) RECORRIDO: FRANCISCO RAMOS - SP0328177, CAROLINE NARCON PIRES
DE MORAES - SP0345730
Sustentou oralmente, o Dr Arthur Luis Mendonca Rollo, por Celso Ubirajara Russomanno..
Sustento oralmente, a Drª. Paula Bajer Fernandes Martins Da Costa, Procuradora Regional Eleitoral
substituta.
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3. EMENTA
RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. ALEGAÇÃO DE
DIVULGAÇÃO DE FATOS INVERÍDICOS E OFENSIVOS. ELEIÇÕES
2020. ARTIGO 57-D, §3º, DA LEI Nº 9.504/97. SENTENÇA DE
IMPROCEDÊNCIA. MATÉRIA JORNALÍSTICA ANTIGA. AUSÊNCIA DE
CONTEMPORANEIDADE E DE VÍNCULO COM O PLEITO VINDOURO.
OFENSA NÃO DEMONSTRADA. TESE DO “DIREITO AO
ESQUECIMENTO” AFASTADA. ILÍCITO ELEITORAL NÃO
CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos os autos do processo acima identificado, ACORDAM, os Juízes do Tribunal
Regional Eleitoral do Estado de São Paulo, por votação unânime, em negar provimento ao recurso.
Assim decidem nos termos do voto do(a) Relator(a), que adotam como parte integrante da presente
decisão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores Waldir Sebastião de Nuevo Campos Junior
(Presidente), Paulo Sérgio Brant de Carvalho Galizia e Nelton Agnaldo Moraes dos Santos; e dos Juízes
Manuel Pacheco Dias Marcelino, Mauricio Fiorito, Afonso Celso da Silva e Marcelo Vieira de Campos.
São Paulo, 23/10/2020
MANUEL PACHECO DIAS MARCELINO
Relator(a)
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4. Documentos Selecionados
RELATÓRIO
Trata-se de recurso eleitoral interposto por CELSO UBIRAJARA RUSSOMANNO contra a r.
sentença anexada ao ID nº 17995851, que julgou improcedente a presente representação,
ajuizada em face de NN&A PRODUÇÕES JORNALÍSTISCAS LTDA (Diário do Centro do
Mundo – DCM) e KIKO NOGUEIRA, fundada no art. 57-D, §3º, da Lei nº 9.504/97.
Em suas razões recursais (ID nº 179996201), o recorrente argumenta, de início, que a
publicação impugnada foi realizada em registrado em nome de pessoa falecida, sendo,site
portanto, apócrifo, e, por consequência, não gozaria da proteção constitucional, razão pela qual
entende que deve ser excluído.
Quanto ao seu interesse processual, afirma que, “a partir da escolha do candidato em
convenção, surge o interesse de agir de propor ações eleitorais, inclusive o direito de resposta.
Em se tratando de ofensa postada na internet, a representação eleitoral pode ser ajuizada ‘a
qualquer tempo’, sendo que o MM. Juiz “a quo” confirmou que o conteúdo está postado”.
Nesse passo, alega ser contraditória a fundamentação da decisão, consistente “no fato de a
sentença entender que a notícia é antiga para não justificar a intervenção da Justiça depois de
tanto tempo, mas não é antiga para retirar o interesse jornalístico da permanência da
postagem. Vale dizer, ou é antiga e deve ser retirada, ou não é e justifica o processamento da
representação”.
Com relação ao mérito da demanda, aduz que, “após ter sido anunciado como candidato,
passou a ser compartilhada, por disparos em massa de Whatsapp de origem desconhecida,
sendo que os fatosuma publicação de matéria dos recorridos, assinada por Kiko Nogueira”,
narrados na notícia seriam antigos, sabidamente inverídicos (falsos) e não transcorreram da
forma colocada.
A matéria em questão teria sido veiculada em 2012 e, segundo afirma, foi publicada com o fito
de prejudicar sua imagem nas eleições daquele ano, além do que, na época, não foi
oportunizada ao recorrente a sua manifestação prévia, contrariando o Código de Ética dos
Jornalistas.
Argumenta, outrossim, que apenas agora a matéria ganhou repercussão, fomentada por seus
adversários; que, além de divulgar fatos inverídicos, é ofensiva e tem caráter nitidamente
eleitoral, podendo afetar a higidez do pleito eleitoral, por manipular a vontade popular através
da propagação de informações falsas.
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5. No mais, coloca que os recorridos já sofreram outras condenações indenizatórias por
publicarem notícias falsas em seu veículo, utilizando-se da prerrogativa da livre informação
para, reiteradamente, ofenderem figuras públicas.
Por fim, invoca o “direito ao esquecimento”, que consiste no direito do indivíduo de não ser
lembrado por situações passadas, constrangedoras ou vexatórias, verídicas ou não, em
desdobramento do princípio da dignidade da pessoa humana.
Requer, assim, o conhecimento e provimento do recurso, para julgar procedente a
representação, determinando a exclusão definitiva do impugnado e proibindo os recorridoslink
de republicarem a matéria falsa impugnada ou difundirem por qualquer meio, especialmente
pelo , sob pena de desobediência e multa. Pede, ainda, a exclusão imediata do ,WhatsApp site
“por se encontrar inconstitucionalmente registrado em domínio em que o titular é pessoa
falecida há mais de três anos”.
Em contrarrazões (ID nº 17996601), os recorridos esclarecem que o de notícias contestadosite
não pende de irregularidade cadastral.
No que concerne ao conteúdo da matéria, afirma que não possui cunho eleitoreiro, mas trata-se
“de uma reportagem de cunho crítico, amparada na liberdade de imprensa e livre manifestação
do pensamento, no qual o jornalista Joaquim de Carvalho, que acompanhou um dia do político
naquela longínqua ocasião, teceu suas impressões e informações, todas embasadas em
”.repositórios confiáveis e incontroversos
Aduz que, “sob a suposição de uma ‘retomada’ desta reportagem, via mensagens de
aplicativos, as quais sequer o recorrente deu-se o trabalho de provar, como bem anotado pelo
D. Juízo de origem, surge a urgência de suprimir esse conteúdo do conhecimento de seu
eleitorado”.
Neste contexto, argumenta que “é ousado a ponto de reivindicar ‘direito de esquecimento’ de
quem quer ser lembrado no momento do voto da população para gerir o maior orçamento
e que,mundial do País (...)”; “ainda que a reportagem fosse contemporânea a este período,
ainda assim, estava embasada no juízo crítico da imprensa”.
Afirma, em síntese, que a reportagem tem cunho jornalístico, não eleitoreiro, e foi publicada em
2012, muito antes desta corrida eleitoral, e que o recorrente pretende emendar e suprimir
reportagens anteriores ao período eleitoral “para moldar o que desejam que seus eleitores
conheçam e pesquisem”.
Além do mais, afirma que o recorrente age de má-fé ao insistir na irregularidade do , asite
despeito da prova de seu registro, bem como por “tentar se aproveitar da Justiça Eleitoral para
suprimir conteúdo anterior ao período da eleição que lhe desagrada e cujo pleito na justiça cível
”.está prescrito
Ao final, requer: a manutenção da r. sentença recorrida; que “seja refutada e advertida a
conduta do Recorrente em tentar se valer da Justiça Eleitoral para amoldar o que pretende que
seja conhecido de seu histórico pregresso junto aos eleitores, tolhendo até mesmo o direito de
”; e, por fim, a condenação à pena de multa, por litigância de má-fé.pesquisar dos eleitores
Remetidos os autos a este e. Regional, foi aberta vista à douta Procuradoria Regional Eleitoral,
que se manifestou pelo desprovimento do recurso (ID nº 1829901).
Vistos até o (ID nº 18299901).
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6. É o relatório.
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO ESTADO DE SÃO PAULO
GABINETE DO RELATOR MANUEL PACHECO DIAS MARCELINO
REFERÊNCIA-TRE : 0600035-72.2020.6.26.0002
PROCEDÊNCIA : São Paulo - SÃO PAULO
RELATOR : MANUEL PACHECO DIAS MARCELINO
RECORRENTE: CELSO UBIRAJARA RUSSOMANNO
RECORRIDO: NN&A PRODUCOES JORNALISTICAS LTDA - ME, FRANCISCO ROBERTO EMBOABA NOGUEIRA
VOTO Nº 2128
No caso, insurge-se o recorrente contra uma matéria jornalística, que teria sido publicada no
ano de 2012, no dos recorridos, acerca de fatos teoricamente inverídicos e ofensivos àsite
pessoa do recorrente, ocorridos em 1992, a qual estaria sendo supostamente compartilhada,
por disparos em massa pelo com o intuito de prejudicar a sua imagem comoWhatsApp,
candidato.
Fundamenta o pedido no art. 57-D, §3º, da Lei nº 9.504/97, :in verbis
“Art. 57-D. É livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato
durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores -
internet, assegurado o direito de resposta, nos termos das
alíneas a, b e c do inciso IV do § 3o do art. 58 e do 58-A, e por outros meios
de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica.
(...)
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7. § 3o Sem prejuízo das sanções civis e criminais aplicáveis ao
responsável, a Justiça Eleitoral poderá determinar, por solicitação do
ofendido, a retirada de publicações que contenham agressões ou
ataques a candidatos em sítios da internet, inclusive redes sociais.
O dispositivo legal em comento, ao tempo em que prevê a liberdade de expressão durante a
campanha eleitoral na internet, veda, por outro lado, o anonimato. Essa restrição tem assento
constitucional e tem por objetivo resguardar direitos de igual relevância, decorrentes do Estado
Democrático de Direito.
Nesse sentido, a Constituição Federal, em seu art. 5º, IV, dispõe que é livre a manifestação do
pensamento, sendo vedado o anonimato, e o inciso V, por sua vez, preceitua que é assegurado
o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou
à imagem.
Dessa forma, a liberdade de expressão somente deve ser restringida excepcionalmente,
quando necessária para proteger direitos de igual ou superior importância, cabendo ao
magistrado fazer um sopesamento desses valores.
Na hipótese em exame, consta do editorial impugnado (ID nº 17994001), intitulado “As duas
”, que a publicação teria sido feita pelofaces do Celso Russomanno que eu conheci em 1992
jornalista KIKO NOGUEIRA, ora recorrido, em 26 de setembro de 2012, circunstância que
afasta, de pronto, o anonimato.
A eventual irregularidade no registro da pessoa jurídica responsável pelo onde a matéria foisite
divulgada desborda dos limites desta ação, sendo certo, outrossim, que esse fato não é
suficiente para caracterizar o anonimato do conteúdo lá divulgado.
Feitas essas considerações, o recurso não comporta provimento.
A matéria contestada, cuja exclusão pleiteia o recorrido, foi publicada há 8 anos no sítio da
internet dos recorridos, inexistindo provas nos autos acerca de eventual republicação recente
do seu teor, tampouco do alegado compartilhamento em massa por meio da rede WhatsApp.
O deferimento da retirada de publicações que contenham agressões ou ataques a candidatos
em sítios da internet demanda a demonstração de que o seu conteúdo, além de divulgar fatos
sabidamente inverídicos ou ofensivos, tem vinculação com o processo eleitoral, e, portanto,
possui aptidão para desequilibrar a igualdade entre os candidatos, o que não ocorreu na
espécie.
Com efeito, não vislumbro, na matéria impugnada, violação à honra do candidato, que justifique
a limitação dos direitos fundamentais à informação e à liberdade de expressão.
Ademais, a reportagem em questão, de cunho eminentemente jornalístico, não guarda qualquer
relação de contemporaneidade com o pleito que se avizinha, razão pela qual não deve, neste
momento, sofrer controle por parte desta Justiça Especializada, sob pena de se subtrair dos
eleitores o acesso às informações existentes sobre os pretensos ocupantes de cargos eletivos.
Sobre o tema, relevante transcrever as lições de José Jairo Gomes (Direito Eleitoral, 16ª
Edição, Ed. Atlas, pág. 156):
“(...) Por outro lado – no âmbito do direito de informação –, os cidadãos têm
direito a receber toda e qualquer informação, positiva ou negativa, acerca
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8. de fatos e circunstâncias envolvendo os candidatos e partidos políticos que
disputam o pleito; sobretudo acerca de suas histórias, ideias, programas e
projetos que defendem. Só assim estarão em condições de formar juízo
seguro a respeito deles e definir seus votos de forma consciente e
”.responsável
Não é demais lembrar que o link que hospeda a matéria impugnada está ativo muitos anos
antes do registro do candidato recorrente e, ao que parece, não foi diligenciada a sua exclusão
em momento anterior, apesar da alegada ofensa.
Por fim, como bem consignou a d. Procuradoria Regional Eleitoral, “o alegado direito ao
esquecimento, que, registre-se, ainda é tema pendente de decisão pelo Supremo
, àTribunal Federal, parece não ser condizente com o exercício de mandato eletivo
medida que aos eleitores deve ser proporcionado o mais amplo acesso às informações daquele
que pleiteia ou exerce mandato popular. No caso, o recorrente, além de exercer mandato de
(grifos nossos).deputado federal, disputa vaga para o Executivo da principal capital do País”
Portanto, em meu sentir, as circunstâncias apresentadas não justificam o sacrifício da liberdade
de expressão e pensamento, tão necessária ao debate, e, por consequência, à democracia, a
fim de excluir da internet a reportagem impugnada.
Por outro lado, as alegações trazidas pelo recorrente não constituem abuso do exercício dos
direitos processuais, razão pela qual deixo de aplicar a sanção de litigância de má-fé requerida
pelos recorridos.
Em razão do exposto, nego provimento ao recurso eleitoral.
É como voto.
MANUEL MARCELINO
Relator
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