A ascensão da segunda Ku Klux Klan nos EUA nos anos 1920
1. A KU KLUX KLAN: SEU RESNASCIMENTO E AUGE NA DÉCADA DE 1920
Autor – Pedro Augusto M. B. M. Gomes
É preciso saber que, aqueles historiadores que pesquisam a Ku Klux Klan,
geralmente consideram que foram três Klans distintas que existiram nos Estados
Unidos da América.
Em 9 abril de 1865, a guerra civil nos Estados Unidos que durou quatro anos e,
ceifou mais de 600.000 vidas chega a seu fim. O General Robert E. Lee finalmente se
rendeu ao General Ulysses S. Grant na Appomatox Court House no estado da Virgínia.
Com o sul do país devastado, coube ao então presidente Abraham Lincoln mostrar sua
complacência com a região, adotando um projeto de reconstrução para os estados
que ali precisavam. Este projeto basicamente se constituía em reconstruir as ferrovias
e indústrias, mas também, garantir a igualdade entre negros – agora livres da
escravidão – e brancos.
Lincoln não viu seu projeto se concretizar, visto que no dia 14 de abril do
mesmo ano da rendição dos Confederados este foi assassinado. Dentro do relatório
da Comissão de Investigação Legislativa de Illinois, o projeto de Lincoln não vingou e,
não foi por falta de tentativa,
Andrew Johnson tentou sem sucesso levar a cabo o plano de Lincoln com
algumas alterações. Os republicanos radicais no Congresso foram capazes
de minar completamente o programa de Johnson. Foi a reconstrução
republicana radical que levou diretamente à ascensão da Ku Klux Klan1
.
A Klan surge em 1866 incialmente na cidade de Pulaski, no estado do
Tennessee. Era uma fraternidade de cavalheiros bem-educados, os quais descendiam
de famílias proeminentes. Ela estava,
[...] limitada regionalmente ao sul e foi organizada com o único propósito
de restaurar a ordem racial que a região havia perdido durante a Guerra
Civil2
.
1
ILLINOIS LEGISLATIVE INVESTIGATING COMMISSION, 1976, p. 4.
2
LEWIS E SERBU, 1999, p. 142.
2. Estes homens poderosos fundarão a Klan utilizando como base uma
fraternidade acadêmica conhecida como “Kuklos Adelphon”: do grego κύκλος
(kyklos), “círculo” e, ἀδελφῶν (adelphōn), genitivo plural, “de irmãos” Sua
transliteração aqui apresentada seria algo como círculo dos irmãos. Ainda dentro do
relatório apresentado anteriormente nesta pesquisa,
Eles adotaram o ritual básico desta fraternidade com algumas mudanças.
Eles pegaram a primeira parte do nome, Kuklos, [...], alteraram
suavemente para Kuklux e adicionaram Klan pelo apelo aliterativo. Assim
nasceu a Ku Klux Klan3
.
Fernandes e Morais ainda vão dizer que,
A ideia de círculo aparece como símbolo de sociedade secreta, fechada em
si mesma. Ancorada numa antiga tradição de linchamentos de negros, a
KKK combatia, além dos negros, os brancos liberais que apoiavam o fim da
segregação, também chamados de negro lovers (amantes de negros, com
duplo sentido), os chineses, os judeus e outras “raças” consideradas
inferiores4
.
Algo de extrema importância também a ser entendido aqui, é que o sul agora
contava com milhares de homens negros livres e, a abolição na mente dos brancos, só
poderia levar o sul do país ao caos. Luiz Estevam Fernandes e Marcus Vinícius de
Morais explicam que algumas “leis de segregação racial haviam feito breve aparição
durante a reconstrução, mas desapareceram até 18685
”.
Para estes homens brancos do sul, os homens negros eram vistos como, “os
libertos “saqueadores” (que) corriam furiosos, agredindo as mulheres brancas e
ameaçando o poder branco6
”. Os homens brancos acusariam os negros de supostos
estupros de mulheres brancas, o que nos leva a pensar que, em uma sociedade onde
a mulher era vista como uma pessoa que não poderia se defender sozinha e
inofensiva, esta seria vítima do negro que para a mesma sociedade, era uma pessoa
sem costumes, ou ainda, dentro de seus termos, como uma “besta inferior”. Este
motivo já era o suficiente para que os homens brancos, que pregavam os bons
3
ILLINOIS LEGISLATIVE INVESTIGATING COMMISSION, 1976, p. 4.
4
FERNANDES E MORAIS, 2007, n.p.
5
FERNANDES E MORAIS, 2007, n.p.
6
GORDON, 2017, p. 25.
3. costumes, pudessem justificar seus atos terroristas contra aos negros, como os
linchamentos e espancamentos. Talvez por isso, tenhamos o termo que é conferido
aos membros da Klan como “Cavaleiros”.
Com a brecha do governo federal que, simplesmente rejeitou a garantia de
homens negros à cidadania política como parte de sua responsabilidade, os homens
brancos intensificaram seus ataques, impondo seu terror aos negros, além dos
linchamentos e espancamentos já citados anteriormente, também na condição de
homens estrategicamente bem empregados, estes passaram a suprimir cada vez mais
os novos homens livres também nas urnas e nos tribunais. Suas ações entre grupos
mais segregacionistas, levava os homens brancos a ir mais além, defendendo em
último caso, o extermínio destas “populações inferiores”. Tudo isso sempre usando
de meios secretos, para que aqueles que praticassem tais atos nunca fossem
descobertos. Diferentemente de proteger estes agressores, levando-se em conta de
que estes não precisavam de proteção, – visto que os homens brancos tinham
posições elevadas que os protegiam e também, se apoiavam na falta de leis para os
homens negros –, a Klan usava deste sigilo para intensificar o medo em suas vítimas.
Até a vestimenta branca carrega um simbolismo o qual Fernandes e Morais o
descrevem como um símbolo que representava,
[...] os senhores mortos durante a Guerra Civil que voltavam para se vingar
na forma de espíritos, acusando os ex-escravos de os terem abandonado
em meio ao conflito. Outra explicação para o uso do lençol branco é a ideia
de que os negros seriam supersticiosos e que, portanto, acreditariam em
espíritos que voltavam para assombrar os vivos7
.
De fato, toda sua “mística” e popularidade ao final do século XIX, atraiu a
atenção de outra parte da sociedade sulista que também, apoiava o grupo e
compartilhava de seus interesses. Estes viram uma ótima oportunidade de se juntar à
Klan,
A KKK era apoiada pela participação de muitos políticos sulistas, mas toda
a sua base era composta por brancos pobres ressentidos. Para se tornar
membro da Klan era necessário ser branco, não ser judeu, “defender a
7
FERNANDES E MORAIS, 2007, n.p.
4. pátria até as últimas consequências” e ser um “bom cristão protestante”,
já que não se aceitavam católicos8
.
O governo do então presidente Ulysses S. Grant tomou medidas para conter a
violência e o crescimento destes grupos de ódio, aprovando leis no começo da década
de 1870 e, em 1871, esta primeira Klan desapareceria por quase meio século, até
renascer novamente no começo do século XX. Mas até mesmo com os esforços de
Grant, que tiraram a Klan de “cena”, o sul ainda seria assolado por outros grupos com
as mesmas ideologias ligadas à supremacia branca, que levariam o governo a mobilizar
as tropas federais uma última vez em 1874.
Em novembro de 1915 no estado da Geórgia, William J. Simmons, um
simpatizante de longa data da KKK, havia se reunido com outros simpatizantes – três
dos quais diziam ser membros originais da primeira – e, do topo da montanha Stone,
estes realizaram uma cerimonia ritualística que consistiu em erguer uma cruz de
madeira, atear fogo à esta, o que marcou simbolicamente o renascimento de uma
nova Ku Klux Klan. Esta cerimônia foi seguida de sua autoproclamação a “Mago
Imperial” (Imperial Wizard), em outras palavras o Líder Nacional da KKK e também,
publicamente direcionou sua proclamação que vai dizer que,
Para todas as nações, povos, tribos e línguas, e para os amantes de Lei e
Ordem, Paz e Justiça, da Terra inteira, Saudações:
Eu, e os cidadãos do Império Invisível através de mim, proclamo para você
da seguinte forma:
Nós, os membros desta Ordem, desejando promover o verdadeiro
patriotismo em direção ao nosso governo civil; paz honrosa entre os
homens e nações; proteção 'para e felicidade nas casas de nossos pessoas;
amor, verdadeira irmandade, alegria e masculinidade entre nós, justiça e
fraternidade entre toda a humanidade; e acreditando podemos melhor
realizar esses fins nobres através de o canal de uma mística de alta classe,
social, patriótica, benevolente associação, tendo um sistema de
alojamento aperfeiçoado, com uma forma ritualística exaltada de trabalho
e uma forma eficaz do governo, não por lucro egoísta, mas pela mútua
melhoria, benefício e proteção de todos os nossos juramentos associados,
seu bem-estar fisicamente, socialmente, moralmente e vocacionalmente,
e seus entes queridos, proclamam ao mundo inteiro que nos dedicamos ao
sublime e agradável dever de prestar ajuda generosa, simpatia e
fraternidade assistência na refulgência da luz da vida e em meio à sombras
negras da morte; em meio a fortuna e desgraça, e o privilégio exaltado de
demonstrar a utilidade prática da grande, mas mais negligenciada,
8
FERNANDES E MORAIS, 2007, n.p.
5. doutrina da paternidade de Deus e fraternidade do homem como uma
força vital nas vidas e assuntos dos homens. Neste convidamos todos os
homens que podem se qualificar para se tornarem cidadãos do Império
Invisível, para se aproximar do portal do nosso beneficente domínio e se
juntar a nós em nosso nobre trabalho de estender a sua limites; na
divulgação do evangelho da KLANKRAFT, encorajar, conservar, proteger e
tornar vital o fraterno relacionamento humano na prática de um saudável
grupo fechado; para compartilhar conosco a glória de realizar o dever
sagrado de proteger a feminilidade; manter para sempre supremacia
branca em todas as coisas; para comemorar o santo e realizações
cavalheirescas de nossos pais; para salvaguardar a direitos sagrados,
privilégios exaltados e instituições distintas do nosso governo civil;
abençoar a humanidade e manter eternamente em chamas o fogo sagrado
de uma fervorosa devoção a um americanismo puro. O Império Invisível é
fundado em caráter sólido, e princípios imutáveis, baseados num
sentimento muito sagrado e cimentado por fins nobres; é promovido de
forma sincero e altruísta através da devoção das almas de muitos homens
e é gerido e governado pela inteligência consagrada de cérebros
pensativos. É a alma do cavalheirismo e do escudo impenetrável da virtude,
o impulso devoto de uma raça inconquistada9
.
Como a Ku Klux Klan original, essa nova está aberta apenas às pessoas nativas
dos Estados Unidos, brancas e protestantes. Vai promover a supremacia branca e o
patriotismo e, além disso, a descrição da organização vai ser similar a de uma
sociedade secreta com seus rituais, cumprimentos, símbolos e sinais característicos.
A Klan do início do século XX vai ampliar seu discurso de ódio. Além de sua
preocupação primária – os negros –, a organização agora passa a ameaçar e intimidar,
todo e qualquer tipo de grupo e pessoas que ameacem de alguma forma sua liberdade
e também, o que eles classificariam como o “estilo americano de vida” (the american
way of life), concentrando seu ódio também contra imigrantes, grupos feministas e
socialistas, bem como, quaisquer outras religiões que entrassem em seu país que não
fosse a deles. Na obra de Simmons voltada diretamente para a Ku Klux Klan, o
KLORAN, temos um exemplo prático do tipo de crença que a KKK tinha e parte de seus
princípios na época aqui estudada – década de 1920 –, quando este vai apontar que,
Nós reconhecemos nossa relação com o governo dos Estados Unidos da
América, a supremacia de sua Constituição, a União dos Estados e as Leis
Constitucionais, e seremos sempre devotados aos princípios sublimes de
um americanismo puro e valentes em defesa de seus ideais e instituições10
.
9
ILLINOIS LEGISLATIVE INVESTIGATING COMMISSION, 1976, pp. 16-18.
10
SIMMONS, 1916, p. 2.
6. Entretanto, a Klan de Simmons continuava apenas no sul dos Estados Unidos
e em 1920 o líder da organização imaginou que precisava dar um passo maior se
quisesse ver sua fraternidade como a maior do país. Ainda que ele recebesse os US $
10.00 – relativos à taxa de inscrição – e, detivesse os direitos de vender regalias a
outros membros da Klan, seu projeto de expansão contaria com a ajuda de dois
publicitários da Southern Publicity Association, Edward Y. Clarke e Elizabeth Tyler.
Simmons junto dos dois publicitários tinham como intuito, transformar a KKK em uma
organização dinâmica. A ligação entre a Ku Klux Klan e a Southern Publicity Association
estava firmado através de um contrato que, “estipulava que [...], Edward Clarke e
Elizabeth Tyler, receberiam – de acordo com o dólar dos anos de 1920 –, US $ 8.00 de
cada taxa de iniciação de US $ 10.0011
”, por novos membros, os quais fossem
diretamente responsáveis pelo recrutamento e, além disso, eles também poderiam
receber US $ 2.00 por “cada membro subsequentemente alistado por qualquer
capítulo existente da Klan12
”. Essa parceria entre Simmons e seus publicitários vai
ampliar consideravelmente os negócios e os recursos da KKK. Richard Baudouin vai
corroborar que,
Enquanto Simmons fazia discursos e mexia no ritual, Clarke se ocupou em
expandir o tesouro, lançando firmas de publicação e manufatura da Klan e
investindo em imóveis. O futuro parecia muito bom13
.
Essa estratégia levou a Klan a números inimagináveis dentro dos Estados
Unidos. Segundo as fontes pesquisadas, o ápice de membros estimados no ano de
1924, era de ao menos 4 milhões de pessoas, “cerca de 5% a 14% da população
elegível14
”. A KKK havia chegado a seu auge, graças a uma máquina de recrutamento
extremamente competente e ainda, de acordo com Levitt e Fryer Jr.,
A estrutura organizacional da KKK da década de 1920, projetada pelo
Departamento de Propagação, era um híbrido que combinava
características de outras ordens fraternas com um braço de recrutamento
11
FRYER JR. E LEVITT, 2012, p. 1888.
12
ILLINOIS LEGISLATIVE INVESTIGATING COMMISSION, 1976, p. 19.
13
BAUDOUIN, 2011, p. 18.
14
FRYER JR. E LEVITT, 2012, p. 1888.
7. sofisticado, resultando em dois conjuntos distintos de hierarquias [...] que
funcionavam mais ou menos independentemente15
.
A citação acima deixa claro que a Klan podia contar com membros que
intimidavam e influenciavam de um lado e que, de outro lado, também poderiam
contar com os membros considerados como os marqueteiros da ordem, os quais
cuidavam das finanças. Nos dois casos, estes membros com funções diferentes uns de
outros serviam como recrutadores para a ordem. Financeiramente ainda no ano de
1924, os autores vão corroborar que a Ku Klux Klan vai bater um faturamento anual
de pelo menos US $ 25 milhões, o que convertidos de acordo com a inflação atual,
daria algo em torno de US $ 300 milhões.
Para os padrões da época, entrar para a Ku Klux Klan era algo extremamente
caro, estamos trabalhando com cifras que chegam a US $ 23.30, aproximadamente US
$ 250.00 atualmente. Este valor estava dividido da seguinte forma,
Cada Ghoul (membro) pagou US $ 10 (US $ 110 em dólares), US $ 6,50 para
comprar um manto oficial (que custou cerca de US $ 2), uma anuidade de
US $ 5, um imposto imperial de US $ 1,80, e também encorajados a
comprar outras mercadorias sancionadas pela Klan, incluindo espadas,
Bíblias e capacetes, e serviços como lavagem a seco e seguro de vida16
.
Da mesma forma que o número de associados crescia consideravelmente na
década de 1920, na política também encontramos dados de que alguns destes
membros também alcançaram cargos de extrema importância dentro do governo
norte-americano. No ano de 1922, o membro da Klan Earl Mayfield foi eleito senador
pelo Texas, derrotando dois congressistas judeus que haviam começado uma
investigação contra a ordem. Por incrível que pareça, essa eleição aconteceu “durante
o período de sua violência mais descontrolada17
”.
A Klan ainda podia contar com membros poderosos dentro de estados como
“Indiana, Tennessee, Colorado, Oklahoma e Oregon18
” e também, ainda dentro da
política – em 1924 –, dados apontam que pelo menos,
15
FRYER JR. E LEVITT, 2012, p. 1891.
16
FRYER JR. E LEVITT, 2012, p. 1891.
17
BAUDOUIN, 2011, p. 22.
18
FRYER JR. E LEVITT, 2012, p. 1891.
8. Governadores em 10 estados e 13 senadores em 9 estados foram eleitos
com a ajuda da Klan. Pelo menos um senador, Hugo Black, que estava
destinado a se tornar um juiz da Suprema Corte dos Estados Unidos, tinha
sido um Klansman19
.
Obviamente que na condição de pessoas extremamente conservadoras e,
seguindo fielmente os preceitos da Ku Klux Klan, estes políticos ligados à ordem se
aproveitaram de sua influência para se opor aos direitos de imigrantes e dos novos
homens negros livres.
Vamos entender como foi a ascensão do poder da Klan na política, baseando-
nos no estado do Oregon como exemplo. Este estado ganharia destaque ainda em
1921 quando um membro da Klan – um vendedor –, chega de mudança da Califórnia
a procura de novos membros. Entendamos que o estado na época,
[...], na primavera de 1921, era então uma improvável potencial fortaleza
da Ku Klux Klan quanto qualquer estado da nação. Este era pacífico e
tranquilo, seu sistema escolar havia praticamente banido o analfabetismo,
e ninguém fazia discursos inflamados sobre raça (97% das pessoas eram
brancas) ou imigrantes (87% eram nativos)20
.
A citação anterior começa de forma poética, uma vez que retrata na primavera
de 1921, um estado pacífico e quase que utópico que, no entanto, a Klan se faz
presente recrutando ao menos uma centena de membros, dos quais destes, a maioria
eram homens da lei – policiais –, os quais se aproveitam de sua posição para linchar
os negros que haviam sido condenados, expulsando estes do estado. Nem mesmo os
católicos não foram poupados, as igrejas encontravam panfletos ameaçadores em
suas portas e caixas de correios, que tinham como único intuito, deixar estes com
medo de possíveis ataques por parte da ordem. Em outras palavras, este movimento
terrorista contra negros e católicos espalhou-se rapidamente.
O responsável por todo este terror foi Luther Powell que, incrivelmente um
ano após a sua chegada, viu o estado do Oregon com as tradições da Ku Klux Klan já
enraizadas. Até mesmo o governador admitiu que eles controlavam o estado. Disse
Ben Olcott – 16º governador do estado entre os anos de 1919 e 1923 – em uma
19
ILLINOIS LEGISLATIVE INVESTIGATING COMMISSION, 1976, p. 21.
20
BAUDOUIN, 2011, p. 19.
9. reunião, “acordamos uma manhã e descobrimos que a Klan havia conquistado o
controle político do nosso estado21
”.
Mas como um grupo de pessoas foi tão bem-sucedido onde outros antes
destes não foram? A resposta está em uma das mais poderosas armas de propaganda
da Klan, o filme de 1915 intitulado Birth of a Nation (Nascimento de uma Nação).
Birth of a Nation foi um filme [...] que definiu novos padrões para a
indústria cinematográfica incipiente. A história que conta se encaixa
perfeitamente na versão da história que a Klan prega. O filme, baseado em
um romance do ministro Thomas Dixon Jr., da Carolina do Norte, foi uma
criação de um talentoso jovem diretor, D. W. Griffith em uma era de
comédias curtas, Griffith queria filmar uma obra-prima que contasse a
grande história de eventos que levaram à Guerra Civil, o grande conflito
em si e, finalmente, a tragédia e o sofrimento da reconstrução, que
culminou com a ascensão da Ku Klux Klan22
.
Em primeiro lugar, o ano do lançamento do filme e do renascimento da Klan –
1915 – poderiam estar diretamente ligados, o que queremos dizer, é que o filme serviu
de estopim para inflamar os novos fundadores da KKK, um dos quais, Simmons foi o
principal responsável. Em segundo lugar, Simmons teria se aproveitado do apelo
promocional do filme, o que garantiu a ele o recrutamento de novos membros para
sua recém fundada ordem. Apenas para apontar
a importância do filme, até mesmo os “líderes
modernos da Klan ainda usam o filme como um
artifício de recrutamento23
”. Em terceiro lugar,
poderíamos trabalhar a iconografia apresentada
no pôster do filme à esquerda.
Para começar, o próprio Simmons já
apresentava a ordem aos Estados Unidos como,
Knights of the Ku Klux Klan (Cavaleiros da Ku Klux
Klan). Vimos até o momento que a Klan
acreditava piamente na supremacia racial, de
21
BAUDOUIN, 2011, p. 19.
22
BAUDOUIN, 2011, p. 21.
23
BAUDOUIN, 2011, p. 21.
10. que sua religião estava acima das demais entre tantos outros exemplos.
Nobreza e religião como elementos de superioridade sobre pessoas aparecem
em vários recortes temporais, mas, um que nos chamou muito a atenção está na baixa
Idade Média. O próprio padre o qual viveu no século XII, Étienne de Fougères, já dizia
que, existiam as classes que dominavam e as classes que eram dominadas. Dentro
daqueles que dominavam estavam os reis, os clérigos e os cavaleiros.
Acreditamos que podemos fazer um link direto destes membros da Klan, que
se julgavam superiores às demais pessoas as quais viviam nos Estados Unidos, com os
ideais da cavalaria medieval. Jacques Le Goff já afirmava que a cavalaria tinha,
[...] uma conotação social cada vez mais aristocrática. Na cavalaria não
entra quem quer! Reis e príncipes distinguem com sua autoridade essa
confraria profissional, a que exigem controlar o acesso, filtrar a admissão.
Sem dúvida, não se pode, como se fazia muito anteriormente, confundir a
origem da nobreza e da cavalaria. Contudo, é forçoso reconhecer que logo
a nobreza controla e comanda a cavalaria, empresta-lhe sua ideologia
[...]24
.
É como a Klan, não é qualquer pessoa a qual pode fazer parte da ordem, mas
sim, aqueles que encaixam dentro de seus ideais. Le Goff concluirá que o ideal de
cavalaria, vai vir “carregado de conotações honoríficas, idealistas, éticas25
”.
Mais um fator que não se deve passar desapercebido dentro desta pesquisa,
são as publicações da Ku Klux Klan. Nos anos de 1920, algumas publicações fizeram
muito sucesso, uma das quais, a Badger American, uma publicação mensal que
circulava no estado do Wisconsin, que contava com assinantes em pelo menos outros
quatorze estados. Sua popularidade alcançou até os melhores resultados entre os
críticos de sua época. O Badger American, “conscientemente imitou muitas das
tendências atuais de publicações em seus esforços para alcançar os leitores26
”. O
crítico Gilbert Seldes afirmava por exemplo que, a coluna de humor do jornal, era a
mais sofisticada dentro do que ele chamava de minor arts da América e ainda, que as
colunas contavam com colunistas como como Don Marquis, Ring Lardner e H. L.
Mencken, os quais eram pilares populares e inflacionários dos principais diários
24
LE GOFF, 2017, p. 210.
25
LE GOFF, 2017, p. 211.
26
HARCOURT, 2017, p. 34.
11. urbanos. A publicação além de contar com humor, também contava com uma coluna
regular que ridicularizava os católicos irlandeses conhecida como Lissen Tu This e,
outra que atacava diretamente os judeus conhecida como The Jolly Jewboy. Outras
publicações da Klan abordavam temas diferentes, mas sempre ligados à ordem.
Vejamos alguns outros exemplos,
Como os recém-fundados Reader’s Digest e Time, grande parte das
publicações da Klan divulgava notícias e artigos em formato compacto [...],
com opiniões prontas. O Searchlight em Atlanta liderou este caminho.
Dedicado principalmente a reportagens sobre as benfeitorias e obras de
caridade da Klan, características como “Ku Kluxin”, uma atividade alegre e
leve de Klan, [...]. [...]. A Fiery Cross, de Indiana, controlada por um
conselho de influentes Klansmen, também se concentrou na
autopromoção e na reimpressão de artigos de publicações populares em
todo o país27
.
Em suma, a popularidade destas publicações ia tão bem na década de 1920,
que até mesmo empresas pagavam para ter suas propagandas estampadas nas
páginas dos periódicos da Klan. Afinal, leitores não faltavam e, segundo ainda
Harcourt,
Seja motivado pela simpatia ou curiosidade, centenas de milhares de
americanos estavam se envolvendo com a comunidade imaginada da Klan
regularmente. Ao encontrar uma audiência considerável dentro e fora da
organização para mensagens de uma identidade Klannish virtuosa e
heroica, esses jornais eram uma forma tremendamente valiosa de
propaganda28
.
Em agosto de 1925, a Ku Klux Klan chega a seu ápice com uma parada que
reuniu cerca de 40 mil membros da ordem, que desfilaram pela avenida Pensilvânia
até o monumento a George Washington na capital dos Estados Unidos. Essa parada
foi para comemorar o resultado do sucesso de tantos de membros da Klan que haviam
sido eleitos no ano anterior. No entanto, a Ku Klux Klan entraria em declínio a partir
de 1926 com disputas de poder internas e também, a partir de ataques contrários por
parte do clero, da imprensa e de um número crescente de políticos.
27
HARCOURT, 2017, p. 35.
28
HARCOURT, 2017, p. 38.
12. BIBLIOGRAFIA
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Montgomery, AL: The Southern Poverty Law Center, 2011.
FRYER JR., Roland G. e LEVITT, Steven D. Hatred and Profits: Under the Hood of the
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pp. 1883–1925, 2012.
GORDON, Linda. The Second Coming of the KKK: The Ku Klux Klan of the 1920s and
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KARNAL, Leandro, MORAIS, Marcus Vinícius de, FERNANDES, Luiz Estevam e PURDY,
Sean. História dos Estados Unidos: Das Origens ao Século XXI. Edição – Kindle: Editora
Contexto, 2007.
LE GOFF, Jacques & SCHMITT, Jean-Claude. Dicionário Analítico do Ocidente
Medieval – Volume 1. 1ª. Edição. São Paulo, SP: Editora UNESP, 2017.
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Press, pp. 139-157, 1999.
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Illinois General Assembly. Chicago, IL: Illinois Legislative Investigating Commission,
1976.
HARCOURT, Felix. The Ku Klux Kulture: America and the Klan in the 1920s. Chicago,
IL: The University of Chicago Press, 2017.
SIMMONS, William. J. KLORAN: Knights of the Ku Klux Klan. 5ª Edição. Atlanta, GA:
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13. THAYER, Joseph H. Thayer’s Greek-English Lexicon of the New Testament. 13ª Edição.
Peabody, MA: Hendrickson Publishers, 2017.